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STJ AUTORIZA A PENHORA DE QUOTAS SOCIAIS DETIDAS PELO DEVEDOR EM EMPRESA QUE ESTÁ EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. AUTORIZAÇÃO JÁ REPERCUTE EM DECISÕES EM MG

  25/05/2023

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Antônio Amabile e Sérgio Ávila.

 

O Juízo de Direito da 3ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Capital/São Paulo deferiu pedido de penhora sobre as quotas sociais das empresas Barilux Serviços de Assessoria e Desenvolvimento de Pesquisas Ltda., Alphatreze Comércio e Serviços Gráficos Ltda., Jim&C Participações Ltda., pertencentes aos executados Márcia Laselva Kindermann e Sérgio Carlos Kindermann (e-STJ, fls. 719-720 e 734-735).

Inconformados, os executados interpuseram agravo de instrumento, em que aduziram que as quotas sociais são impenhoráveis ante o flagrante prejuízo da affectio societatis; que a quota representa uma parte ideal do capital social, configura uma expectativa de direito no momento de liquidação da sociedade e não possui exequibilidade; que o plano de recuperação judicial das empresas Jim&C e Chiva acabou de ser aprovado e a medida interfere na recuperação das empresas; e que a manutenção da constrição, além de afrontar norma prevista no ar. 805 do NCPC, configura flagrante excesso e causa evidente prejuízo aos executados, uma vez que a exequente ainda não comprovou ter buscados outros meios menos gravosos para satisfazer seu crédito.

O Tribunal de origem negou provimento à insurgência recursal, alegando que “Nada impede a constrição de quotas sociais, na medida em que não se está atingido os bens da sociedade, mas tão somente as cotas sociais de propriedade dos sócios. Ademais, a medida em estudo encontra amparo legal no dispositivo processual previsto no artigo 835 do Código de Processo Civil. Por outro lado, a recuperação judicial da pessoa jurídica também não impede a constrição judicial de patrimônio que pertence aos sócios”.

Em apelo especial, os executados insistiram que a penhora de quotas das sociedades em recuperação judicial impõe a terceiros a aceitação de pessoa estranha ao quadro social por constrição judicial, e que tal imposição seria evidente prejuízo a affectio societatis. Alegaram não haver vantagem ao credor, visto que "[...] lhe recairá não apenas direitos, mas também obrigações" (e-STJ, fl. 775) e, ainda, aduziram que somente com a concordância geral dos credores arrolados no plano seria possível operar a oneração de bem ou direito afeto à empresa em recuperação judicial (e-STJ, fl. 776). Arguiram que a admissão de penhora sobre quotas sociais deveria ser excepcional, dependente de comprovação, por parte da exequente, do exaurimento de outros bens menos gravosos aos executados.

No REsp 1803250/SP, o voto do Ministro Relator, Marco Aurélio Bellizze, reconheceu “a impossibilidade de recair a penhora sobre a participação societária do sócio, em execução promovida por seu credor particular, no específico caso de encontrar-se a correlata sociedade empresarial em recuperação judicial”.

O voto-vista do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva permitiu a penhora de quotas sociais, inclusive de sociedades empresárias em recuperação judicial, desde que verificada a inexistência de outros bens passíveis de constrição. Seu argumento central é o seguinte: o art. 789 do Código de Processo Civil de 2015 determina que o devedor responde com todos os seus bens, dentre os quais se incluem as quotas que detiver em sociedade simples ou empresária, por suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei. Somente é possível obstar a penhora e a alienação das quotas sociais se houver restrição legal e não há, a princípio, vedação para a penhora de quotas sociais de sociedade empresária em recuperação judicial. O Ministro Moura Ribeiro e a Ministra Nancy Andrighi acompanharam o voto-vista no sentido de manter a decisão do TJ/SP, e o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino acompanhou o Relator, que restou vencido. Ao final do julgado, fica evidenciado o seguinte:

a) a jurisprudência do STJ está pacificada no sentido da penhorabilidade de quotas de sociedade de responsabilidade limitada por dívida particular de sócio, sendo certo que a constrição não encontra vedação legal e nem afronta a affectio societatis, uma vez que não conduz, necessariamente, à inclusão de novo sócio (AgInt no AREsp 1.058.599/RS, Quarta Turma, DJe 24/11/2017; AgInt no AREsp 978.024/SC, Terceira Turma, DJe 16/6/2017);

b) As quotas sociais integram a esfera patrimonial do sócio que as detém, e não a da sociedade empresária correspondente. Tanto é assim que o art. 861 do CPC/15 prevê expressamente o procedimento a ser seguido na hipótese de serem “penhoradas as quotas e ações de sócio em sociedade simples ou empresárias”. A doutrina esclarece: “Sendo o executado integrante de pessoas jurídica e tendo as suas quotas ou ações valor econômico, poderá sofrer a penhora destas. Eventual disposição proibitiva constante do estatuto ou do contrato social não impede a constrição. Não há que se confundir a penhora das quotas ou ações do sócio com a penhora da empresa, notadamente senão pela distinção entre pessoa natural e jurídica, especialmente pelo sujeito que figura no polo passivo da execução. (Comentários ao código de processo civil. Coord. Angélica Arruda Alvim [et al.]. Saraiva, 2017, e-pub, sem destaque no original).

c) A lei processual contém regra expressa dispondo que o devedor responde patrimonialmente com todos os seus bens – dentre os quais, obviamente, se inserem as quotas sociais de sua titularidade –, excetuando-se, tão somente, aqueles cuja penhorabilidade seja restringida por lei (art. 789 do CPC/15).

Uma ressalva importante: em se tratando de direito falimentar, quando se tratar de recuperação judicial, pode-se inferir que a intenção do legislador foi no sentido de não obstar a saída do sócio dos quadros da empresa, sobretudo ao se considerar a garantia constitucional de que ninguém pode ser compelido a permanecer associado (art. 5º, XX da CF/88). Contudo, para o caso de falências, a Lei 11.101/05 apresenta uma única restrição imposta aos titulares de quotas ou ações, no art. 116, inc. II: “Art. 116. A decretação da falência suspende: [...] II – o exercício do direito de retirada ou de recebimento do valor de suas quotas ou ações, por parte dos sócios da sociedade falida”. Isto é, uma vez decretada a falência do devedor, o exercício do direito de retirada dos sócios ou o recebimento do valor de suas participações na empresa ficam suspensas.

O REsp 1803250/SP já começa a ter repercussão nas alterosas. Conforme decisão exarada nos autos da recuperação judicial de nº 5001049-77.2017.8.13.0027, a MMª Juiza da Vara Empresarial, da Fazenda Pública e Autarquias, de Registros Públicos e de Acidentes do Trabalho da Comarca de Betim, Dra. Lorena Teixeira Vaz, decidiu pela possibilidade da  penhora de cotas que um sócio detém junto à recuperanda, decisão essa em resposta ao ofício expedido pelo Juízo da 8ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo – Capital, onde tramita execução movida por  credor particular contra o sócio da empresa em recuperação. 

 

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