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Qual o prazo de supervisão mais adequado para a recuperação judicial?

  08/02/2022

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Antônio Amabile e Sérgio Ávila

 

A Lei nº 14.112/2020 reformou o artigo 61 da LREF que determinava que após a concessão da recuperação judicial pelo juiz, o devedor permaneceria em recuperação judicial até que se cumprisse todas as obrigações previstas no plano que vencessem até dois anos após a concessão. Este período de dois anos denomina-se período de supervisão.

Segundo a nova redação do artigo 61, proferida a decisão de concessão da recuperação prevista no artigo 58, o juiz poderá determinar a manutenção do devedor em recuperação judicial até que sejam cumpridas todas as obrigações previstas no plano que vencerem até, no máximo, 2 (dois) anos depois da concessão da recuperação judicial, independentemente do eventual período de carência.

Assim, sob a perspectiva do juiz da recuperação, o que era uma obrigação passou a ser uma faculdade, isto é, poderá o juízo arbitrar se o devedor ficará ou não sob supervisão e, ainda, por quanto tempo, ficando, a princípio, limitado ao prazo de 2 anos da concessão.

Tal reforma fez surgir uma série de debates envolvendo a supervisão judicial das recuperandas mormente em relação à sua natureza jurídica, aos direitos tutelados e aos critérios de aplicação.

A natureza jurídica da supervisão é fiscalizatória. Durante o período estabelecido, o descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano acarretará a convolação da recuperação em falência. Por isso, a supervisão tutela os direitos dos credores relacionados ao cumprimento do plano de recuperação judicial que se encerrará apenas quando cumpridas as obrigações vencidas durante o período de supervisão.

Um período rígido de supervisão acaba não atendendo à variedade de situações apresentadas pela realidade das empresas em recuperação. De um lado, empresas e grupos grandes com recuperações complexas, não raro, exigiam um prazo muito superior a dois anos. De outro, em recuperações de empresas pequenas sem tanta complexidade envolvida, não fazia sentido manter uma supervisão bienal. Daí concluir-se de antemão que a maior flexibilidade na estipulação do prazo de supervisão baseia-se no reconhecimento de que o caso concreto é mais capaz de informar qual o prazo de supervisão mais adequado do que uma previsão genérica aplicável a processos tão díspares.

Outra questão a ser considerada como uma das razões para a flexibilização do período de supervisão é o custo que ela acarreta nos processos de recuperação. A supervisão obriga o Judiciário a manter o processo ativo mesmo quando não é necessário, e para o devedor, que arca com o administrador judicial. Os credores com interesse na recuperação, por sua vez, acompanharão de acordo com seu próprio benefício percebido.

Em decisão recente (Autos do processo nº 1129712-90.2018.8.26.0100), o r. Juízo da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Comarca de São Paulo, Foro Central Cível, concedeu a recuperação judicial e declarou encerrado o processo. Na sentença, a opção pela desnecessidade do período de supervisão judicial por dois anos foi justificada pelo Meritíssimo com base na identificação de poucos benefícios práticos da medida para o caso; no fato de que eventual inadimplemento futuro poderia ser objeto de execução específica ou mesmo de pedido de decretação da falência; no entendimento de que o encerramento da recuperação coloca a recuperanda em melhores condições de mercado para sua reabilitação (empresa deixa de carregar a pecha de recuperanda), funcionando como fator de fresh start e contribuindo com a renovação da sua reputação para fins de obtenção de novo crédito; nos custos envolvidos com destaque para aqueles impostos ao Poder Judiciário a quem não cabe impor a tramitação de um processo sem qualquer demonstração de utilidade.

A mudança do artigo 61 da LREF remeteu os processos de recuperação para uma análise do caso concreto sobre a conveniência e oportunidade da supervisão, considerando-se especialmente sua extensão baseada em uma análise de custos e benefícios. Assim, a partir de agora haverá casos de encerramento sem supervisão, de supervisão por prazo inferior a dois anos, de supervisão por prazo bianual e até por prazo superior quando, ao alvedrio do Juízo, o caso assim o exigir. A análise sobre o prazo de supervisão mais adequado poderá contar com a análise do administrador judicial, figura importante de auxílio ao juízo da recuperação.