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Utilidade do relatório de Constatação Prévia para o processamento da recuperação judicial

  24/10/2021

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Antônio Amabile e Sérgio Ávila

 

O deferimento do processamento da recuperação judicial é uma medida que traz repercussões econômicas não apenas para o devedor, mas também para os credores e para o mercado em geral. O processo de recuperação é custoso e envolve dispêndio de tempo e recursos públicos e privados. Por conta disso, nem toda recuperação requerida deve ser processada de imediato. Um dos critérios para subsidiar o indeferimento de uma recuperação é a inviabilidade evidente da empresa candidata à recuperação.  

Assim, para se evitar o processamento de recuperações que não apresentem chances de prosperar e atingir a sua finalidade, a última reforma da Lei nº 11.101/05 promovida pela Lei nº 14.112/20 normatizou o instituto da Constatação Prévia. Tal regulamentação veio reconhecer a utilidade das perícias prévias realizadas principalmente durante a última década em processos de recuperação judicial, cristalizando o instituto no art. 51-A da mencionada Lei.    

O Relatório de Constatação Prévia existe para análise das reais condições de funcionamento da empresa que requer a recuperação judicial e, também, para verificação da regularidade e da completude da documentação apresentada com a petição inicial (1). Deve apresentar informações suficientes para que o magistrado possa reunir condições mais adequadas para decidir sobre o processamento ou não do processo de recuperação judicial. Por isso, a Constatação Prévia é considerada uma “providência que visa garantir a aplicação regular e efetiva da recuperação judicial em defesa da preservação dos interesses público, social e dos credores” (CARNIO, 2018).

O laudo deverá ser produzido e apresentado no prazo máximo de 5 (cinco) dias (§ 2º do art. 51-A da LREF). Neste período, o profissional responsável poderá inclusive, se necessário, solicitar ao juiz a determinação da realização de diligência sem a prévia ciência do devedor (§ 3º do art. 51-A da LREF), quando entender que esta poderá frustrar os seus objetivos.

Importante notar que a constatação prévia consistirá, objetivamente, na verificação das reais condições de funcionamento da empresa e da regularidade documental, sendo vedado o indeferimento do processamento da recuperação judicial baseado na análise de viabilidade econômica da devedora (§ 5º do art. 51-A da LREF). A análise quanto à viabilidade econômica da devedora ou mesmo sobre qualquer aspecto relacionado à manutenção da sua atividade empresarial no mercado cabe exclusivamente aos credores e não ao perito. Esta é a essência da LREF que não pode ser maculada pelo instituto da Constatação Prévia (DEZEM e BECKER, 2019).   

Caso a Constatação Prévia demonstre que o principal estabelecimento do devedor não se situa na área de competência do juízo, o juiz deverá determinar a remessa dos autos, com urgência, ao juízo competente (§ 7º do art. 51-A da LREF).    

Quando a Constatação Prévia detectar indícios contundentes de utilização fraudulenta da ação de recuperação judicial, o juiz poderá indeferir a petição inicial, sem prejuízo de oficiar ao Ministério Público para tomada das providências criminais eventualmente cabíveis (§ 6º do art. 51-A da LREF.).

Apresentado o Relatório, o devedor será intimado do resultado da Constatação Prévia concomitantemente à sua intimação da decisão que deferir ou indeferir o processamento da recuperação judicial, ou que determinar a emenda da petição inicial, e poderá impugná-la mediante interposição do recurso cabível (§ 4º do art. 51-A da LRF).

O indeferimento da petição inicial devido ao não preenchimento dos requisitos legais não implicação na convolação em falência. Tal segurança deriva da inteligência do art. 5º da  Recomendação Nº 57, do CNJ.

Enfim, o Relatório de Constatação Prévia é um instrumento à disposição do juízo para averiguação da conveniência do processamento de uma recuperação com poucas ou mesmo nenhuma chance de prosperar considerando-se imediatamente que o objetivo da recuperação empresarial, nos termos do art. 47 da Lei no 11.101/2005, é viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, preservando a empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica e, mediatamente, as consequências sociais e econômicas dos processos de recuperação empresarial.

 

(A) Analise da documentação tendo em vista a sua consistência e correspondência com a realidade fática da empresa (COSTA, Daniel Carnio, 2018).